UM ÍDOLO

Meu pai gosta de cachaça, cigarro e Esporte Clube Vitória. Eu não. Ele gosta de cerveja, vinho e futebol, porque tínhamos que combinar em alguma coisa. Funcionário do Banco do Brasil, morou em Caetité, Poções, Esplanada, Rio Real até se fixar em Santo Antônio de Jesus. Eu o acompanhei, desde Poções, e sempre que possível, integrei sua lista de companheiros para viagens futebolísticas.

Igual à maioria das crianças brasileiras, eu sonhava ser jogador de futebol. Tinha times, criados na imaginação de um mundo, no qual eu era o grande astro do futebol. Acho que era fácil perceber minha euforia, quando era permitida a minha participação em algum baba. Ainda em Esplanada, eu tentava participar de tudo, em meu time tinha Sinho, Toca e Cacau, parceiros constantes. Em Rio Real, tive vários plantéis, e Tiziu estava em todos. Nenhum precoce, todos ruins de bola, mas a gente se divertia.

Parece que os pais leem os filhos. Meu pai ia assistir a algumas das minhas atuações, embora preferisse, com justiça, assistir a meu irmão, que era mais habilidoso. Ele chegou a comprar um jogo de camisas do Internacional, para usarmos em nosso time - optou pelo time gaúcho para evitar o conflito bavi na escolha. Ele marcou presença no estádio do quintal da professora Lucília, além de enfrentar o sol dos campos das AABB que tivemos acesso e o campo da casa de Saulo e Lúcio em Rio Real. No entanto, o melhor que ele fazia era me levar para os jogos do Bahia.

Em 1979, fomos assistir a Atlético x Bahia, em Alagoinhas. Chegamos cedo, a tempo de chupar picolé, rolete de cana e ficar com uma sede inesgotável. Meu pai parecia empolgado, principalmente com o time de Alagoinhas, que fazia uma boa campanha. Ele conversava com os amigos sobre Merica, Dendê, Américo, os times que foram e os que estavam sendo bons, enquanto eu sofria com a sede e pedia insistentemente água e só passava ambulantes com refrigerante e picolé. Em um determinado momento, ele disse: "Tá vendo aquele cabeludo ali? Se você quiser ser um grande jogador, faça igual a ele. Olhe bem pra ele! É o melhor de todos aí e é de seu time". A sede aguardou até o final do jogo (sem gol, mas talvez o mais divertido de todos).

A partir daquele dia, minhas camisas tricolores ganharam o número 8, escrito com hidrocor, dei-me um nome imaginário nos babas, o mesmo nome do meu parceiro nos times do meu mundo imaginado. Além disso, houve um enorme esforço de minha parte para seguir a referência, para aprimorar técnica, chutando bola na parede, brincando com bola canarinho, chuveirinho e dente de leite quase o dia inteiro. Cheguei até a evoluir para uma bola de couro número 5, pesada pra caramba. Após muita insistência, aprendi a jogar futebol, com a certeza de que nunca fui um Douglas.

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